A última palavra
Liderar é aceitar que ninguém pode dividir o peso da última palavra com você
A parte que ninguém conta sobre liderar é que você nunca pode terceirizar a última palavra. Você pode ter sócios, conselheiros, mentores, time, família, amigos. Pode ter todo tipo de gente competente ao seu redor, reuniões longas, planilhas detalhadas, consultores experientes e até dados incontestáveis. O time pode sugerir, os sócios podem opinar, os conselheiros podem aconselhar. Mas ninguém vai decidir por você. É simples: quando a hora chega, a palavra final é sua.
E decidir não é apenas escolher. É carregar consequências. Certas e erradas. Em especial as erradas.
É lidar com a culpa que acompanha o erro, mesmo quando parecia inevitável. É sentir o peso das escolhas, dos erros e dos acertos, às vezes em silêncio, às vezes em meio à ruídos. É aprender a conviver com o julgamento de todos, inclusive daqueles que jamais carregaram ou suportariam esse fardo.
“Se você quer agradar a todos, não seja líder. Venda sorvete.” — Steve Jobs
É também ter clareza de que nem sempre é possível aproveitar os acertos. A celebração dura pouco. Logo, uma nova decisão já está na fila. O ciclo não termina. Ele se repete e fica cada vez mais complexo.
A coragem de pagar o preço
Há momentos em que ninguém pode decidir junto. É você contra você, com todas as dúvidas, riscos e consequências. É nessa pressão solitária que um líder vive. Uma vida que muitos idealizam de fora, mas que por dentro é feita de um silêncio ensurdecedor e de muitas noites sem sono.
A pressão e a solidão não são momentos de exceção no jogo. Elas são o próprio jogo. E sobreviver nele é a prova de que você está no papel certo, no lugar onde ninguém pode ir por você.
“Coragem é graça sob pressão.” — Ernest Hemingway
Com o tempo, um bom líder aprende a conviver e descobre que a solidão nunca desaparece. E talvez nem devesse. Porque é justamente ela que lembra, todos os dias, que no fim das contas a responsabilidade é sua.
Ser líder é ter coragem de pagar esse preço.
Um caminho inevitável
Uma decisão pode impactar dezenas ou centenas de famílias, direta ou indiretamente. Cada colaborador que confiou sua carreira na visão de um líder. Cada parceiro que fez planos contando com as escolhas que você faria. Cada cliente que acreditou que sua empresa seria capaz de entregar o que prometeu.
“Se você não quiser ser criticado, por favor, não tente nada novo.” — Jeff Bezos
Para eles, sua decisão não é apenas uma escolha ou um movimento de negócio. É o meio para a realização de seus sonhos e planos. E a parte invisível disso tudo é que, muitas vezes, eles nem percebem o tamanho do peso que essa decisão (e você) carrega.
Muitos fazem planos de vida, como comprar uma casa ou investir na educação dos filhos, considerando que a sua visão está certa. O seu “sim” ou o seu “não” se tornam o alicerce sobre o qual outros constroem seus futuros.
É aí que, em última instância, você percebe que algumas decisões simplesmente não podem ser compartilhadas. O conflito de interesses está em todos os lados. Cada pessoa ao seu redor pode ser beneficiada ou prejudicada pelo que você decidir. Muitas vezes, até seus sócios, sua equipe, seus conselheiros e até a sua própria família. E há ainda quem, por cuidado, tente proteger você: preservar sua saúde, respeitar seus limites, aliviar sua carga. Não falam por mal, falam pelo bem. Mas esse bem, nem sempre, é o melhor a ser feito. E você sabe disso.
Nesses momentos, a solidão deixa de ser circunstancial e se torna inevitável.
Um papel que não admite falhas
Existem dias mais leves e outros insuportavelmente pesados. Com o tempo você também aprende que não pode deixar nada abalar o seu dia. Porque a sua fraqueza se torna, imediatamente, o gatilho de insegurança nos outros.
Para tudo e para todos, seus dias precisam parecer sempre incríveis. Não importa a pressão, não importa o problema, não importa a dúvida. A sua função exige que você sustente a confiança de quem depende de você. É um teatro de invulnerabilidade. Um papel que não admite falhas.
Paradoxalmente, estar cercado de elogios, recebendo aplausos, em cima de palcos cada vez maiores, acumulando admiradores não significa ter alguém para contar. Pelo contrário: muitas vezes significa ter ainda mais pessoas com expectativas sobre as suas escolhas.
Se você não tiver clareza de quem você é, para onde você está indo e dos seus porquês, você se torna refém da própria relevância. Você deixa de liderar para começar a ser liderado pela imagem que criou. E é aí que muitos tropeçam.
Pressão é privilégio
A pressão é fardo, mas também é privilégio. Porque quem aprende a suportá-la descobre que ela abre portas que estariam fechadas para qualquer outra pessoa. Liderar sob pressão é o que separa quem joga por jogar de quem realmente joga para vencer.
O bom líder se acostuma a problemas cada vez mais complexos. Aprende a pensar de maneira mais estratégica, mais completa. Fica mais sagaz. Mas, inevitavelmente, mais solitário.
Essa evolução não acontece nos dias fáceis. Ela acontece nas noites em claro, nos dilemas que poucos encontrariam uma solução, nas vezes em que você decide sem ter todas as respostas. É carregando esse fardo que um verdadeiro líder se constrói. E é nessa guerra diária que a visão de um líder se prova.
“Sempre entregue mais do que esperam.” — Larry Page
Carrego comigo uma citação que diz “entre o mapa e o terreno, escolha sempre o terreno”. Livros, frameworks, conselhos, relatórios… tudo isso ajuda. Mas, no fim, é você quem está pisando no terreno. É ali, diante da realidade nua e crua, que a decisão precisa ser tomada. O mapa pode ser útil, mas o terreno é implacável.
Esse tipo de escolha exige coragem. Porque o mapa dá a sensação de controle, mas o terreno traz a verdade. E um líder não pode se dar ao luxo de viver e colocar tudo em risco apenas pelas direções e informações que um mapa fornece.
Uma escolha diária
Liderar é assumir que não existe manual. É aceitar que ninguém pode dividir o peso da última palavra com você. Liderar é ser responsável pelas vitórias e pelas derrotas, sem poder terceirizar a culpa ou a glória.
Mas liderar não deve ser um castigo. É, sim, um lembrete diário de que a responsabilidade é sua. E de que, se você não pagar o preço, ninguém pagará por você. Mesmo quando está mais pesado do que parece possível suportar. Mesmo quando ninguém entende. Mesmo quando o mundo parece desabar.
É entender que a solidão e a pressão, paradoxalmente, forjam um líder de verdade. E ainda assim, mesmo diante de tudo contra, ser líder é uma escolha diária.
Esse caminho não é para qualquer um. Muitos preferem esperar que alguém aponte qual caminho seguir. Mas um líder de verdade abre o caminho. Ele pisa no terreno, encara o imprevisível e toma decisões mesmo sem ter todas as respostas. Liderar é abrir e ser o caminho.
E, se há um privilégio nisso tudo, é o de viver na arena onde poucos têm coragem de entrar. De estar diante de escolhas que moldam não apenas o próprio futuro, mas o de todos à sua volta.
THGD
Felipe Lomeu