As regras invisíveis do jogo
Se a vida for um jogo, quais são as regras que você ainda não percebeu?
A vida costuma ser descrita como um jogo. Eu mesmo recorro a essa metáfora o tempo todo. E, como em qualquer jogo, existem as regras explícitas e as regras invisíveis. No jogo da vida, as regras explícitas todo mundo conhece: estudar, trabalhar, ganhar dinheiro, acumular conquistas, fazer amigos, construir uma família. As invisíveis, você só descobre jogando.
São essas regras ocultas que, no fim, separam quem consegue jogar em outro nível de quem permanece preso no mesmo lugar. Compreender essas regras cedo é a diferença entre jogar como amador e atuar como alguém que realmente domina o tabuleiro.
Eu tenho estudado muito sobre comportamento, tempo e energia. E, ontem, em uma longa conversa com o ChatGPT, perguntei:
Qual a próxima pergunta que eu deveria para fazer pra voce?
Ele me respondeu:
Boa, Felipe. A escolha da próxima pergunta depende do caminho que você quer abrir comigo. Te mostro algumas direções possíveis: (…) “Se a vida for um jogo, quais seriam as regras que eu ainda não percebi?”
Para uma pessoa que tem hiperfoco como eu, o desdobramento dessa pergunta me fez esticar mais 3 horas a conversa. Se você está pronto para essa conversa, segue o fio.
Tempo e energia: a verdadeira moeda
O recurso mais limitado não é o dinheiro, é o tempo. Cada jogador entra no jogo com um cronômetro invisível. Ele começou a rodar no dia em que você nasceu e não para nunca. Você não sabe quanto resta, só sabe que está correndo. Peter Drucker, considerado o pai da administração e da gestão moderna, dizia que o tempo é o recurso mais escasso, e se ele não for gerenciado nada mais pode ser gerenciado.
Muitos passam anos correndo cada vez mais rápido, sem perceber que estavam correndo no jogo errado. O segredo não é apenas acelerar, mas ser intencional com a direção. É jogar o jogo certo antes que o tempo acabe.
O filme O Preço do Amanhã mostra isso de forma brutal: no lugar de dinheiro, as pessoas pagam e vivem com tempo. A cada gasto, a cada escolha, o relógio da vida corre mais rápido. E a verdade é que maioria de nós vive em modo automático, gastando sem pensar, enquanto poucos entendem o valor real de cada segundo. Desde que assisti esse filme, essa metáfora nunca saiu da minha cabeça. Ela me fez enxergar que não se trata apenas de trabalhar ou ganhar mais, mas de direcionar cada movimento com intencionalidade, porque cada escolha é um gasto de tempo irreversível.
Pra deixar tudo ainda mais complicado, não basta você gerenciar horas. Talvez você esteja me questionando, dizendo que sim, consegue gerenciar seu tempo. Se você faz isso bem feito, parabéns. Você é uma mosca branca no mundo que vivemos atualmente. Mas voltando… muitos estudos mostram que líderes e profissionais de alta performance não administram apenas tempo, mas energia. Eles entendem que produtividade não é sobre a quantidade de horas trabalhadas, mas sobre a qualidade da energia que se leva para cada hora.
A premissa para uma performance duradoura está em equilibrar gasto e renovação de energia. Não adianta só acumular horas de trabalho. É preciso cuidar de sono, alimentação, exercício e recuperação. Atletas de elite não chegam ao topo apenas por talento, mas porque tratam o corpo e a mente como ativos inegociáveis. Kobe Bryant, Cristiano Ronaldo, dentre vários outros, são exemplos clássicos disso.
Tim Grover, treinador de Michael Jordan, Kobe Bryant e Dwyane Wade, escreveu em Relentless que os grandes não se alimentam de motivação, mas de obsessão. Para ele, consistência não é sobre ter energia perfeita todos os dias, mas fazer o que precisa ser feito mesmo quando está cansado, exausto ou com dor.
E é aí que mora a diferença. Porque nem todo dia é igual. Você não joga só com tempo, mas com energia mental, física e emocional. Haverá noites mal dormidas, dias de exaustão, semanas em que corpo e mente parecem não acompanhar. O que separa os que conseguem jogar em outro nível de quem permanece preso no mesmo lugar é a forma como administram essa energia. Não é à toa que foco é uma palavra mágica para todo profissional de alto desempenho.
Muitos perdem o jogo porque gastam sua energia em batalhas irrelevantes. Querem responder a tudo, provar tudo, estar em todos os lugares. Jogadores experientes entendem que energia é moeda tão valiosa quanto tempo e só deve ser investida no que realmente importa. Escolher onde colocar essa energia é, muitas vezes, a própria diferença entre apenas jogar ou redefinir o jogo.
Se o tempo é o tabuleiro, a energia é a peça que você move. E cada movimento errado custa caro demais para ser desperdiçado em batalhas sem sentido. E mesmo que você cuide do tempo e da energia com maestria, ainda assim há um limite para o que pode alcançar sozinho. Porque a vida não é um jogo de um jogador.
Você será lembrado pela forma que jogou
Outro erro comum do jogador iniciante é achar que a vida é um jogo individual. Não é. Sempre haverá aliados, adversários e neutros.
“O talento vence jogos mas só o trabalho em equipe ganha campeonatos” — Michael Jordan
Dentre vários estudos que já passei, é quase que consenso que equipes com alta confiança entre seus membros são significativamente mais produtivas e mais propensas a reter talentos. Equipes que confiam umas nas outras podem performar até 50% melhor. É por isso que se fala tanto em segurança psicológica como fator número um de times de alta performance. Isso significa que as alianças certas aceleram anos de jornada, enquanto as erradas podem atrasar uma vida inteira.
Jack Welch, lendário CEO da GE, dizia que o maior dever de um líder era colocar as pessoas certas nos lugares certos. Para ele, o jogo era sobre ter coragem de tirar quem não estava preparado e promover quem estava pronto, mesmo que isso gerasse desconforto no curto prazo. Essa é a essência da aliança inteligente: construir relações que multipliquem o seu tempo e a sua energia, sustentando o seu próprio crescimento.
E não se trata apenas de alianças. Existe uma outra moeda invisível extremamente poderosa: a reputação. Jeff Bezos a definiu de forma simples: “sua marca é o que as pessoas dizem sobre você quando você não está na sala”.
Sua reputação abre ou fecha portas. A confiança está diretamente ligada à reputação. Essa lógica não vale apenas para pessoas, mas também para empresas, que nada mais é do que um conjunto de pessoas. A confiança é um multiplicador invisível que pode acelerar ou travar qualquer estratégia.
Ben Horowitz, em The Hard Thing About Hard Things, lembra que as pessoas não prestam atenção no que você diz, mas no que você faz. Cultura e reputação não são slogans em paredes de escritório, mas escolhas reais que todos observam. O modo como você lida com crises, pressões e dilemas é o que define se sua palavra vale ou não.
Jogadores inexperientes focam apenas em resultados imediatos. Exímios jogadores entendem que reputação e legado são parte inseparável da pontuação final. Você não será lembrado apenas pelo que conquistou, mas pela forma como jogou.
Escolhas suas batalhas
Outra regra invisível: nem toda luta vale a pena.
Jogadores iniciantes querem vencer todas as partidas. Lutam em qualquer disputa, reagem a cada provocação, gastam energia em cada batalha. Jogadores experientes entendem que perder algumas batalhas é inevitável. Eles não entram em todas as disputas, porque sabem que energia desperdiçada hoje pode custar a guerra de amanhã. Por isso, guardam energia e recursos para as batalhas que realmente decidem o jogo.
Sun Tzu já ensinava que aquele que tenta ser forte em todos os pontos será fraco em todos os pontos. Em um dos meus artigos, eu fiz uma analogia a uma partida de War. Na mesma linha, Nassim Nicholas Taleb, em Antifrágil, reforça que a vida é feita de choques, volatilidade e perdas inevitáveis. Para ele, quem tenta se proteger de tudo acaba frágil. O verdadeiro jogador sabe lidar e usar as derrotas a seu favor.
Saindo do subjetivo, a McKinsey, uma das principais empresas de consultoria empresarial do mundo, em seus estudos sobre estratégia, mostra que empresas que concentram recursos em poucas prioridades têm mais que o dobro de chance de gerar retornos acima da média em comparação às que dispersam esforços em múltiplas frentes.
A mesma lógica se aplica à vida. Cada sim traz um custo oculto: energia, foco, oportunidade. Cada vez que você escolhe travar uma batalha pequena, sacrifica recursos que poderiam estar guardados para a disputa que realmente importa.
Jogadores de alto desempenho sabem que abrir mão do que não importa é tão estratégico quanto avançar com o que importa. Talvez, inclusive, esse seja o verdadeiro caminho. Eles entendem que consistência não é fazer tudo, mas fazer o que importa repetidamente.
O jogo que poucos percebem
O que parece ser o jogo principal, dinheiro, status, poder, quase nunca é o que realmente faz sentido. O meta-jogo é encontrar coerência e satisfação. Para alguns, pode ser impactar os outros, para outros, pode ser aparecer ou ter mais do que os outros. No fim, o maior desafio é entender o que mata a sua sede.
Steve Jobs dizia que a única maneira de fazer um ótimo trabalho é amar o que você faz. Essa é a essência do meta-jogo: descobrir qual história você está escrevendo e se é essa história que você quer continuar escrevendo. A reputação, a energia, as alianças, o tempo… tudo converge para a mesma pergunta: no fim, o que restará da sua história?
Jogadores que percebem isso cedo jogam em outra divisão. Param de buscar apenas pontos visíveis e começam a jogar para deixar seu próprio legado, seja ele qual for.
No fim, a vida é um jogo seletivo. Ele não se impressiona com velocidade nem com atalhos. Ele exige clareza sobre o tempo que você tem, disciplina para gerir a energia que você gasta, sabedoria para escolher as suas batalhas, inteligência para formar alianças e consistência para proteger sua reputação.
Tim Grover diria que isso não é sobre motivação, mas sobre obsessão. Jack Welch lembraria que, no fim, são as pessoas certas nos lugares certos que fazem a diferença. Ben Horowitz reforçaria que você é o que você faz sob pressão. Ignorar essas regras invisíveis é viver como amador. Compreendê-las é aceitar que o jogo nunca foi sobre vencer todo mundo, mas sobre vencer a si mesmo.
E a provocação que fica é simples: se a vida for um jogo, quais são as regras que você ainda não percebeu?
THGD
Felipe Lomeu