O jogo mudou: mude ou morra!
Como empresas vencedoras estão jogando um jogo diferente. E por que você precisa mudar o seu.
Nas últimas semanas, falei sobre o que está por trás da minha forma de viver e pensar. Mas hoje, é dia de falar sobre negócios. Depois de uma série de reflexões sobre minha trajetória, chegou a hora de compartilhar a premissa que, há mais de 10 anos, norteia todas as decisões que tomo quando o assunto é desenvolvimento de negócios. E mesmo com todas as mudanças dos últimos tempos, essa premissa continua mais viva do que nunca.
Então, antes de compartilhar histórias, cases, playbooks, frameworks ou estratégias específicas que já usei ou vi por aí, preciso abordar essa premissa básica. Mas, primeiro, é preciso colocar algum contexto para que essa perspectiva faça sentido.
O mundo mudou. E o jogo também.
Em pouco mais de um século, passamos por três grandes eras nos negócios. E cada uma delas moldou o comportamento de consumo da sua época com diferentes formas com que, nós consumidores, interagimos com produtos e serviços.
Na Revolução Industrial, o poder estava nas mãos de quem controlava os meios de produção. O consumidor era passivo. A maior parte da população era só mais uma engrenagem no sistema de produção. O acesso ao conhecimento era extremamente restrito e, consequentemente, as pessoas consumiam basicamente o que estava disponível para elas. Henry Ford chegou a dizer que o cliente podia escolher a cor do seu carro contanto que fosse preto, ilustrando como a preferência do consumidor tinha pouca voz naquela época. As empresas produziam em massa e os consumidores aceitavam o que houvesse. A estratégia vencedora era sobre eficiência operacional, escala e distribuição.
Depois, veio a Era da Informação, por volta dos anos 1950. Com mais acesso à educação e informação, surgiram as primeiras profissões que exigiam capital intelectual e o consumidor ficou um pouco mais exigente. Ainda assim, nas décadas seguintes a dinâmica mudou pouco. As pessoas consumiam principalmente os produtos disponíveis e acessíveis. Já as marcas que dominavam os meios de comunicação de massa, como rádio, TV e jornal, controlavam a narrativa e, consequentemente, os mercados. Nessa época, a estratégia vencedora era sobre domínio da narrativa através da mídia tradicional.
Mas tudo mudou por volta de 2010, com a popularização do smartphone e das redes sociais transformando a internet em uma via de mão dupla. Nós, consumidores, ganhamos voz e deixamos de apenas consumir informação: agora interagimos, opinamos, avaliamos, influenciamos e, cada vez mais, produzimos informações em larga escala. A lógica inverteu e tudo mudou. O jogo passou a ser outro. Agora, para uma marca dominar a narrativa, ela precisa que as pessoas sejam parte da narrativa. Não basta comprar espaço nos meios tradicionais. A reputação de uma marca é, em grande medida, aquilo que os consumidores dizem sobre ela nas redes e comunidades. Ou, como resumiu Jeff Bezos, “marca é o que dizem sobre você quando você não está na sala”.
Em outras palavras, a popularização do smartphone foi o catalisador que democratizou não apenas o acesso à informação, mas o poder de criação e distribuição de conteúdo. Essa democratização transferiu o controle da narrativa das empresas para os consumidores. Segundo dados da Nielsen, 92% dos brasileiros confiam mais em recomendações de amigos e familiares do que em publicidade tradicional, enquanto 75% desconfiam dos anúncios convencionais. Ou seja, hoje, para dominar a narrativa, não adianta comprar espaço. É preciso que as pessoas queiram falar de você. Que elas façam parte da sua narrativa.
A reputação de uma marca já não é o que ela diz ser, mas o que as pessoas dizem sobre ela. E na prática, quem não entendeu isso, está perdendo o jogo.
O jogo virou um grande labirinto.
Eu vivi numa época em que o investimento em mídia online sequer existia. Vi surgir a briga e acompanhei a discussão sobre o online versus offline. Depois, desktop versus mobile. Hoje esse debate já se dissipou porque está cada vez mais claro que é tudo uma coisa só. O consumidor transita por todos os lugares: celular, Instagram, TikTok, LinkedIn, Facebook, Spotify, rádio, YouTube, podcasts, TV aberta, streaming, outdoor, lojas físicas, e-mail, WhatsApp, dentro de aplicativos e até aqui no Substack.
A jornada do cliente agora tem infinitas possibilidades e não é mais linear. Ele está permanentemente conectado e em constante processo de pesquisa e decisão de compra. Ele pode descobrir uma marca no TikTok, pesquisar avaliações em blogs, ver anúncios na TV e finalizar a compra na loja física, ou qualquer outra combinação. Nesse cenário, de múltiplos canais e excesso de informação, não adianta tentar “ganhar” o cliente na força bruta, despejando verba em campanhas massivas e empurrando produtos goela abaixo. Esqueça, não vai funcionar. Os consumidores filtram o que não confiam, ignoram mensagens irrelevantes e têm opções de sobra como nunca antes.
Como vender mais?
Sou procurado com frequência por líderes e empreendedores buscando respostas diretas para um desafio comum: vender mais. Esperam de mim soluções táticas, atalhos ou fórmulas rápidas. E sim, existem boas práticas, canais eficientes, abordagens que funcionam. Mas com o tempo, percebi que começar por aí costuma ser um erro. O real crescimento de um negócio não vem da resposta direta à pergunta “como vender mais?”, mas da coragem de reformular essa pergunta. De olhar para dentro e revisar fundamentos.
Acredito que responder diretamente à pergunta “como faço para vender mais?” pode levar a abordagens míopes. Buscar apenas ações diretas pode até trazer algum resultado de curto prazo, mas tende a ser pequeno, quando não desastroso, perto do potencial que se alcança ao responder essa pergunta sob outra perspectiva. Uma perspectiva indireta.
Pode parecer que eu não gosto de vendas. Muito pelo contrário. Eu amo vendas e respeito profundamente os vendedores. E, como empreendedor, sou o maior vendedor dos meus negócios. Fato é: não existiriam negócios, produtos, serviços ou marcas sem o ato de vender. Em uma empresa, só existem duas grandes funções: vendas e todo o restante. Se não houver vendas, nada mais se sustenta. Ou seja, todo o restante da companhia precisa se organizar para que as vendas aconteçam e sejam cada vez maiores e melhores.
Mude a pergunta. Mude o resultado.
Mas se “como vender mais?” não é a melhor pergunta, quais são então? Prefiro começar com essas três:
Como posso melhorar meus processos?
Melhorar processos não é apenas sobre eficiência interna. É sobre eliminar fricções na experiência do cliente. É reduzir atrito, gargalos, desperdícios. É facilitar a vida de quem compra. Em resumo, o foco deve estar na eficiência operacional combinada com fluidez na jornada do cliente.Como posso melhorar meus produtos?
Empresas que aprimoram continuamente seus produtos ou serviços constroem marcas fortes e justificam preços premium. Mas melhorar um produto não é só sobre qualidade técnica, também é sobre preço, acesso, usabilidade e contexto. Às vezes, o que o cliente precisa não é de um produto melhor, e sim de algo mais simples, mais acessível ou mais coerente com sua realidade. Em resumo, o foco é entregar valor real, não só performance técnica.Como posso melhorar a vida das pessoas?
Essa talvez seja a pergunta mais negligenciada e a mais poderosa. E não, não estou falando de ESG, abraçar árvores ou discursos sociais forçados. Estou falando de relevância real. De empatia prática. De resolver uma dor que importa. Empresas que entendem isso criam experiências, não apenas transações. Os consumidores da era digital não querem só produtos. Querem soluções que façam diferença na vida deles. E sim, isso pode ter a ver com um parcelamento mais justo, um atendimento mais humano ou com o que o produto representa na rotina de alguém. Em resumo, o foco aqui é impacto positivo genuíno.
Se você entende o que está por trás dessas perguntas e trabalha para respondê-las, as vendas virão naturalmente e de forma consistente. E não precisa de muita pesquisa para comprovar isso. Basta observar: os negócios que hoje se destacam em seus mercados, locais ou globais, estão, de algum modo, respondendo a essas três perguntas todos os dias. Enquanto isso, empresas que se concentram apenas em vender mais, a qualquer custo, estão perdendo espaço. E, aos poucos, morrendo.
Em outras palavras, vender mais é consequência de um conjunto de melhorias contínuas na operação, na proposta de valor e no impacto gerado para o cliente. Até você aperfeiçoar o que entrega e como entrega para o seu cliente, quase nada mais importa nas estratégias de crescimento. Empresas obcecadas apenas por metas de vendas, ignorando qualidade e satisfação, podem até manter números por um tempo, mas dificilmente sustentam sucesso no longo prazo. E tudo isso começa na mentalidade de quem lidera. Processos, produtos e impacto no cliente só melhoram quando existe alguém disposto a provocar as perguntas certas e bancar as mudanças necessárias.
"Até você construir excelentes produtos, quase nada mais importa. Encontre um pequeno grupo de clientes e faça com que amem o que você está fazendo." - Sam Altman
No fim das contas, a melhor resposta para “como vender mais” é: não comece pensando em vender. Comece pensando em como servir melhor. Aprimore seus processos para entregar com eficiência e consistência. Desenvolva produtos ou serviços tão bons que vendam por si, porque resolvem problemas de verdade. Entenda profundamente quem compra de você e torne a vida dessas pessoas melhor, mesmo que seja em um detalhe pequeno, mas significativo. Faça isso e elas não só comprarão de novo, como trarão outras pessoas genuinamente.
Seja tão bom que vender se torne inevitável.
Vendas são o efeito colateral de um trabalho bem-feito em toda a cadeia de valor. Priorize a construção desse valor. Como pregava Peter Drucker décadas atrás, “o objetivo do marketing é conhecer e entender tão bem o cliente que o produto ou serviço se venda sozinho”. E se você chegar nesse ponto, no tal product-market fit, quando as pessoas realmente amam o que você oferece, a pergunta “como vender mais?” se responde sozinha. Você terá defensores da sua marca vendendo por você. O restante (campanhas, canais, técnicas de venda) passa a ser apenas combustível, não o motor.
Por isso, sempre que me perguntam como aumentar vendas, devolvo com outras perguntas: Como melhorar seu processo? Como melhorar o seu produto? Como melhorar a vida do seu cliente? As respostas a essas perguntas constroem estratégias muito mais sólidas. Estratégias que geram marcas memoráveis, clientes leais e resultados duradouros. Vender mais, então, deixa de ser o objetivo. E passa a ser só uma consequência natural.
A verdade é que, hoje em dia, quem foca apenas em vender mais, vende menos. Quem foca em servir melhor, vende mais e melhor. Por isso, a pergunta certa não é “como vender mais?”. É “como ser tão bom que o cliente queira comprar, indicar e voltar sempre?”.
Essa é a pergunta que move negócios vencedores. E que deveria mover você também.
THGD
Felipe Lomeu
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